"No fim da regata é que estaremos prontos"

Seis meses e alguns dias depois de ter naufragado em pleno oceano Índico, o <em>Team Vestas</em> voltou a competir com os outros na Volvo Ocean Race. O DN foi a bordo e conta tudo
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Ver os outros continuar e ficar para trás foi uma dor de alma para toda a equipa do Team Vestas Wind. É o pior que pode acontecer a um marinheiro - não ir ao mar. Sem sal, enferruja.

Chris Nicholson, o skipper, não escondia ontem a "ansiedade" e "expectativa" que sentia. Ao fim da manhã, a equipa ia finalmente voltar a competir com as outras seis concorrentes da Volvo Ocean Race (VOR).

O barco naufragou no oceano Índico na noite de 29 de novembro. Foi depois reparado em Itália. Na semana passada chegou à Doca de Pedrouços. Foi posto na água exatamente seis meses depois do naufrágio, em 29 de maio. A tripulação treinou-se desde então no Tejo. Ontem, a corrida deixou de ser contra o tempo. Foi mesmo contra o resto da frota, em duas corridas de treino - mas corridas à mesma.

Estes são velejadores profissionais, que não gostam de perder nem a feijões. Esse era o objetivo: não perder. E não perderam. Na primeira corrida de treino ficaram em quinto lugar; na segunda em sexto. A frota voltou finalmente a ter os sete barcos com que partiu de Alicante em 11 de outubro do ano passado.

Sentados todos no convés do barco, momentos antes de deixarem a Doca de Pedrouços, fez-se o briefing preparatório da corrida: "Vocês sabem todos correr, então corram." Assim se resumiu o discurso de motivação de Chris Nicholson, um australiano de quase 46 anos, eletricista de formação - trabalhou nas minas para ter dinheiro para velejar - que já vai na quinta edição da VOR, a sua segunda como skipper.

De resto, tecnicalidades de navegação ininteligíveis para um leigo - ainda para mais em inglês, a língua franca numa tripulação que reúne dois australianos, dois neozelandezes, um argentino, dois dinamarqueses, um holandês e um irlandês (Brian Carlin, o repórter de bordo).

Vista na televisão, a partida de uma regata costeira destes veleiros de 20 metros pode ser algo interessante. Até à hora marcada andam às voltas perto da meta, desordenados - e subitamente, a segundos do fim, alinham todos e zarpam. Vista de dentro de um dos barcos, é um susto.

As tangentes entre uns e outros são permanentes. Parece - mas é uma falsa impressão - que os skippers se divertem dirigindo os seus barcos uns contra os outros. A visibilidade que o comandante tem ao leme é quase nenhuma, por estar tapado pela vela da proa. Aí vai um marinheiro que é os olhos do skipper e lhe aponta os caminhos. Existem regras de prioridades muito bem definidas - como no trânsito automóvel - e não há gritarias a bordo. A brisa é ligeira. O Team Vestas raramente ultrapassou os dez nós de velocidade (cerca de 18,5 km/hora).

Quando Nicholson anuncia que se vai mudar de direção, todos sabem exatamente o que fazer. Junto a ele, vai geralmente o navegador - agora Tom Addis, depois do despedimento do anterior, o holandês Wouter Werbraak, considerado responsável pelo naufrágio no Índico - com um tablet preparado para resistir a quedas e à água do mar. Tem aberta uma carta marítima digital e vai recomendando a Chris Nicholson a melhor rota. Percebe-se que às vezes a tripulação é curta para tudo o que há a fazer dentro do barco.

Um cabo soltou os palavrões

Na primeira corrida, os erros foram fáceis de diagnosticar: o skipper decidiu-se por um bordo inicial junto à margem norte do Tejo, com menos vento do que a margem sul, e que o fez atrasar-se: chegou ao fim do primeiro troço na quinta posição, só com os barcos do Dongfeng e do Team SCA (que fez uma falsa partida) atrás de si.

No segundo troço recuperou e, junto às boias de viragem, a embarcação de bandeira dinamarquesa (a Vestas é uma empresa dinamarquesa do setor da energia eólica) estava prestes a passar de quinto para segundo lugar. Mas aí - no único momento em que se ouviram palavrões a bordo - soltou-se um cabo de uma vela da proa, que a deixou a bater no ar. A manobra atrasou-se, o Team Vestas ficou em quarto e depois, já perto do fim, seria ainda ultrapassado pelo Abu Dhabi.

Mesmo assim, Nicholson (um velejador duas vezes olímpico e seis vezes campeão mundial) acha que "correu tudo muito bem". A tripulação mostrou-se afinada e rápida nas manobras. Mas o tempo perdido custa muito a esquecer - e sabe a pouco o que ainda falta para a prova terminar (pouco mais de 1500 milhas, ou seja, quase 2800 km): "No fim da regata é que estaremos prontos."

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